O início do ensino médio nunca foi fácil pra ninguém. Culturalmente dizendo, parece que esta fase piora bruscamente dentro das terras do tio Sam. O alto índice de surtos, assassinatos, bulliyng e violência dentro das escolas americanas vindo de alunos considerados excluídos, quietos ou denominados “losers” pelos alunos mais populares são incontáveis. Como se não bastasse a carga de pressão tradicional que os americanos fazem em cima dos estudantes, há toda uma força de rituais que parecem ser obrigatórios para que você desfrute o melhor da escola, como se o fato da adolescência estar, de fato, indo para o espaço e uma vida de responsabilidades estar chegando não fossem o suficiente para aterrorizar muitos estudantes. É entre estes temas não tão incomuns, que o segundo longa de Stephen Chbosky se destaca pela incrível delicadeza de sua direção.

Contando a história de Charlie (Logan Lerman, de “Percy Jackson e o Ladrão de Raios“), um garoto tímido e pouco popular que ingressa no ensino médio com imensos receios. No filme, ele nos apresenta de forma magistral um grupo de jovens que aceita muito bem sua condição de loucos e diferentes (Bem-vindo a ilha dos brinquedos quebrados), buscando se divertir ao máximo com isso. A expressão americana Wallflower, traduzida para invisível, define muito bem aqueles garotos: “alguém solitário; pessoas tímidas que ninguém conhece; alguém que fica em plano de fundo, observando os acontecimentos” (Urban Dictionary). 

Nele se encontram o gay Patrick (Ezra Miller, de “Precisamos Falar Sobre o Kevin”) e sua meia-irmã Sam (Emma Watson, a Hermione de “Harry Potter”), uma menina bonita, mas ingênua, que já beijou toda a escola. Com o começo da amizade, Charlie passa a ver (e a viver) dramas comuns da adolescência, dos mais banais aos mais sérios – mas, que, como tudo nessa fase da vida, parecem muito maiores do que são. Não é por acaso que as histórias se desenrolam no período mais difícil da escola: a preparação para os exames finais e as escolhas de carreiras e faculdades.

Essa é minha vida e eu quero que você saiba que estou feliz e triste ao mesmo tempo, algo que ainda não entendi bem como acontece, diz o personagem principal no início do filme, resumindo toda a experiência vivida na adolescência. 

Tratar temas adolescentes é algo bastante delicado de se fazer, pois como o universo abordado é, por si só, cheio de contradições e incongruências, é bem difícil fazer com que quem assista leve aquilo a sério. Uma coisa é tratar sobre esse universo, e outra completamente diferente é encarar o assunto como um adolescente, e ver aquilo com tais olhos.

As Vantagens de Ser Invisível” é um forte expoente do primeiro caso, visto que tudo o que está na tela, todos os conflitos, sentimentos, desejos, e atitudes exalam muita honestidade e dignidade, fazendo com que observemos aquilo com um sorriso no canto da boca, e quem sabe uma lágrima presa, pois é tudo muito identificável, e toca de maneira verdadeira no espectador. Talvez seja pelo fato da obra original ser adaptada por seu próprio criador que o filme pareça tão focado em expor os personagens de forma tão carismática e consequentemente, interessantes e fortes. O que se destaca, muito positivamente, é a acertadíssima trilha sonora. Tão acertada, que boa parte da linguagem figurativa dos personagens são expressas dentro das músicas, além de compor maravilhosamente bem a ambientação do longa. Exemplo disso são as belas sequências dentro da ponte.

A direção de atores junto do esforço dos mesmos é inspiradora e surpreendente. Emma Watson definitivamente deixou para trás seu papel como Hermione Granger. Logan Lerman segura de forma impressionante o delicado papel de Charlie. O garoto consegue expressar e transpor precisamente todas as necessárias expressões e presença necessária para um personagem complexo deste, sem nunca apelar para o exagero ou ficar na monotonia típica destas produções. E Ezra Miller compõe muitíssimo bem o gay que, cansado das hipocrisias, toma a dianteira e se expõe (vai apanhar muito, inclusive fisicamente, é claro), o que não o impedirá de ter as mesmas desilusões amorosas dos demais – sua atitude expansiva, desafiadora e agressiva não o poupará tampouco de cometer os mesmos erros dos outros. 

O tom melancólico trazido pela direção cai como uma luva naquele universo, fugindo com habilidade de uma possível queixa de que o artifício nada mais é do que a simples revolta comum que a tal idade traz. Além de construir cenas extremamente bem feitas, desenvolvidas no tempo correto, como na montagem que é feita enquanto Charlie lê as suas cartas ou quando ele fica chapado em uma festa ou ainda na cena em que o trio de amigos está no carro e Sam sobe na caçamba. E é nesse clima melancolicamente saboroso que vai sair a bela frase que resume o filme. Ao perguntar à Sam porque ela se casaria com o imbecil, ela vai responder (sempre elas, as mulheres, as mais sábias): ‘We accept the love we think we deserve’. (Aceitamos o amor que achamos que merecemos.) Ela estava falando, na verdade, para ele, e acaba acertando a todos no processo.

 

 

Com “As Vantagens de Ser Invisível”  Chbosky mostra a mão pesada da vida, dando socos de preconceitos, abusos, depressão, ignorância, violência e indiferença, mas ao mesmo tempo, mostra com carinho, como é possível ter amor à vida e com esse amor, conseguir desviar de todos esses socos, mesmo quando um ou outro acerta em cheio.

 

Posts Anteriores:

[ESPECIAL] – Detona Ralph 

[ESPECIAL] – As Aventuras de Pi

[ESPECIAL] – Argo

[ESPECIAL] – Intocáveis

[ESPECIAL] – A Hora mais Escura

Não deixe de conferir as novidades do CineOrna através das nossas redes sociais:

Facebook | Twitter | Filmow | G+ | Instagram | Tumblr | Pinterest